Que desculpas podem ser adiantadas, por quem se queira aventurar no estudo da história do Concelho?
O Arquivo na Imprensa
Expresso ( Nº 1127 de 4 de Junho de 1994 )
" Idanha: um caso exemplar
HAVERÁ por esse Portugal fora casos idênticos, ou parcialmente parecidos, ao caso exemplar que é o do Concelho de Idanha-a-Nova no distrito de Castelo Branco. No entanto, escolhemos este município que mostra, lapidarmente, o grande drama da sociedade portuguesa neste findar de século, seguramente extrapolável para outras zonas e outros concelhos.
Idanha-a-Nova tem cerca de 1100 Km2, 14.115 habitantes repartidos por 17 Freguesias, 10.886 alojamentos com uma relação área/habitante de 20Km2 para 1 habitante. A freguesia/sede do concelho em cerca de 2450 moradoras.
Dos alojamentos existentes são habitualmente ocupados 5825. Numa amostragem de 1407 famílias, mais de 50 por cento (exactamente 788) não tem crianças, sendo que, entre as famílias com crianças e que na amostra totalizam 619, 557 têm apenas duas. Só em Monsanto verificou-se nos últimos dez anos uma diminuição anual de 50 indivíduos.
O concelho tem Penha Garcia, Idanha-a-Velha, Monsanto, Rosmanhinal e Proença-a-Velha com grande interesse turístico, histórico-arqueológico e etnográfico, como em toda a sua área.
Nos últimos mandatos, a Câmara Municipal, presidida por Joaquim Mourão, tem realizado um trabalho notável, recorrendo a todos os fundos e programas possíveis da UE e, entre 1990 e 1993, ao Programa Operacional da Raia, integrado no PDR da Região Centro. Com uma gestão financeira prudente, a Câmara tem uma situação económica equilibrada.
Foram concretizados, e refiro os mais significativos, os seguintes projectos: piscinas (cobertas e descobertas); biblioteca municipal, escola C + S, pavilhão polidesportivo convenientemente equipado; parque de campismo com «bangalós», piscina e campos de ténis Centro Cultural Raiano; um fabuloso Arquivo Histórico Municipal; largas dezenas de quilómetros de estradas rectificadas e pavimentadas; escola profissional, Pousada de Monsanto (alugada à Enatur) e finalmente, foi instalada na sede do concelho uma extensão do Instituto Superior Politécnico de Castelo Branco. No entanto...
A agricultura - tradicional ocupação da população de Idanha está agonizante, com excepção de uma pequena zona onde se produz tabaco; conta-se, nessas terras raianas que «o que está a dar, é a cultura do «girassidio», isto é a obtenção de subsídios pela plantação de girassol que, em muitos casos, nem é sequer colhido. Indústrias não há. Iniciativa privada não se vê: a zona industrial, que Joaquim Mourão implantou, tem apenas uma instalação: uma queijaria com câmara frigorifica de cura, que a própria Câmara construiu. Com uma população envelhecida, vitima de uma constante sangria demográfica, Idanha-a-Nova tem, de certo, uma qualidade de vida bem superior à da esmagadora maioria dos municípios do litoral.
Mas, qualidade de vida para quem? Qual é a política de fixação da população no interior do pais que os Governos, nomeadamente, os do PSD que beneficiaram a partir de 1985 dos Fundos Comunitários, tem desenvolvido? Que política de atracção de técnicos, de jovens e de capitais para investimento, dirigida para o interior, tem sido desenvolvida em Portugal?
Para quê e para quem servirão, daqui a dez anos, os magníficos projectos implantados e construídos em Idanha-a-Nova com o suor, o esforço e eventualmente as lágrimas de Joaquim Mourão? Para quê os milhões da UE?
Ao serviço de que modelo de desenvolvimento e de que projecto de sociedade? Quem responde às angústias e à consciência dos desafios dramáticos do futuro de homens e autarcas exemplares como Joaquim Mourão?
Não seriam estes temas, estas políticas e estes dramas os que deveríamos ver discutidos nesta campanha eleitoral? Será , que os candidatos, e até os partidos, fazem uma ideia aproximada do pais real?
A mim, urbano, que esteve e que meteu as mãos no concreto do Portugal real e profundo, parece-me que discutir o federalismo, a soberania nacional e as cláusulas da UE dará muito gozo e deleite a Paulo Portas, Manuel Monteiro, Eurico de Meio e a todos os outros candidatos e analistas, mas não resolve, sequer, um só dos pequenos e grandes dramas deste país que somos. "
in Expresso (Nº 1127 de 4 de Junho de 1994)
Nota: Posteriormente, através de um comentário sobre este Post fiquei a saber que a autoria deste texto é de César de Oliveira, rectificação que registo com o maior gosto e prazer. Com César de Oliveira aprendi imenso, quer em termos históricos quer em termos éticos e também de gestão autárquica.
2 comentários:
Por acaso não se esqueceu de indicar o nome do autor da crónica que transcreveu? Para amnésicos afirmo que o texto foi da lavra do malogrado e saudoso Professor Doutor César Oliveira cuja fotografia, com os seus inesquecíveis bigodes, encima o artigo. O seu a seu dono.
Limitei-me a indicar a fonte, Jornal Expresso e a fazer a transcrição do site da Câmara Municipal de Idanha, que não incluí a referência ao autor. Agradeço-lhe a rectificação e é com um prazer acrescido que releio o texto, sabendo que foi escrito pelo Professor Doutor César Oliveira, prematuramente desaparecido e que me ajudou a descobrir, com as suas publicações, A História do Movimento Operário em Portugal e mais tarde a História dos Municípios Portugueses. Obrigado, mais uma vez.
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