"..existe uma espécie de património gastronómico que deve ser preservado"
"Cada cidade ou cada região tem a necessidade de prestar atenção aos seus valores, com o obrigação de os estudar, valorizar e promover."
in: Diário xxi de 19/4/2006
“Falta uma rede de património na região”
Quarta-Feira, 19 de Abril de 2006
Alerta no Dia dos Monumentos
Segundo o director regional do Instituto do Património, os municípios podem lucrar se articularem os seus monumentos com os dos vizinhos. José Afonso participou nas actividades do Dia dos Monumentos dedicadas às crianças, “os futuros protectores do património”
Daniel Sousa e Silva e Susana Margarido
“Quem sabe dizer o que é um monumento?” A questão foi lançada por José Afonso a um grupo de cerca de 30 crianças de escolas do 1º Ciclo do Ensino Básico do concelho de Castelo Branco, que estiveram ontem na Câmara local a propósito da comemoração do Dia Internacional dos Monumentos e Sítios.
O director regional do Instituto Português do Património Arquitectónico (IPPAR) de Castelo Branco não teve de esperar muito. Rapidamente surgiram braços no ar. “Acho que pode ser um edifício ou uma coisa muito antiga”, disse uma das crianças. “Uma estátua”, sugeriu outra. José Afonso explicou então que “são boas respostas, mas um monumento pode ser também um conjunto de edifícios, um local de, por exemplo, um famosa batalha, uma pintura muito valiosa ou outras obras de arte”.
Antes da actuação do Coro da Universidade Sénior de Castelo Branco e também das crianças, o presidente da autarquia local recordou que “não se pode destruir o que foi deixado pelos antepassados”. Mas Joaquim Morão entende que o património “pode ser alterado e actualizado para novos usos e finalidades”, apontando como exemplo a intervenção profunda realizada recentemente no Jardim da Cidade.
O grupo de crianças seguiu depois para uma breve visita ao Jardim do Paço Episcopal albicastrense, em que o guia de serviço foi o próprio José Afonso. De acordo com o director regional, ao contrário da “destruição do Litoral, no Interior ainda existe imenso património”. É certo que “a maioria está esquecido e degradado devido à acção do tempo”. Contudo, “muito está em condições de ser recuperado”, sublinha.
“INCENTIVAR OS MAIS JOVENS”
O tema escolhido este ano pelo IPPAR para a celebração do Dia dos Monumentos e Sítios intitula-se “Jovens de Hoje - Património de Amanhã” e tem como objectivo “chamar a atenção para o património de cada região”, refere José Afonso. O propósito especial é incentivar os mais jovens, destaca o director regional, “a não esquecer esta riqueza que também é deles, dando-lhes a noção que são as crianças os futuros protectores do património”.
Ainda no âmbito das comemorações, realizou-se ontem uma visita guiada à Aldeia Histórica de Idanha-a-Velha, dando especial enfoque ao facto de se tratar espaço patrimonial classificado. Alguns alunos do curso de Turismo Rural e Ambiental da Escola Profissional de Idanha-a-Nova “mostraram pratos regionais, porque também se pode dizer que existe uma espécie de património gastronómico que deve ser preservado”, refere José Afonso.
A nível nacional, o programa de comemoração incluiu a abertura gratuita ao público dos monumentos e sítios, e, oferecendo em particular às crianças e jovens, actividades culturais, pedagógicas e lúdicas, nomeadamente, ateliers, visitas guiadas, concertos, jogos lúdicos, teatro, exposições, dança e feiras de livros.
José Afonso recorda potencialidades económicas da articulação entre municípios
“Falta uma rede de património na região”
- Qual a finalidade da preservação do património?
- Hoje o património tem uma grande importância devido ao impacto da globalização. Cada cidade ou cada região tem a necessidade de prestar atenção aos seus valores, com o obrigação de os estudar, valorizar e promover.
Neste contexto, em vez de se ter uma visão pessimista é possível criar uma estratégia positiva, ou seja, potenciar o património da região para ser conhecido em outros locais, servindo também para aumentar o nível de identidade das populações.
- Existem outras vantagens?
- Isto pode ser também um factor de contribuição para o desenvolvido sustentável. A componente turística, em especial o de vertente cultural, podem beneficiar imenso, pois o património é uma das grandes fontes de atracção turística.
- Como pode ser delineada essa estratégia?
- As câmaras municipais têm de deixar de estar viradas só para o seu concelho e para os seus monumentos e tentar criar uma articulação com as localidades vizinhas. Isso seria possível com a criação de uma rede de património à escala regional.
- Isso já acontece com a Rota das Aldeias Históricas...
- Sim, mas não funcionam verdadeiramente, porque cada município só se preocupa com a sua aldeia. Ainda falta fazer um verdadeiro salto nessas parcerias.
- Pode dar um exemplo concreto do que pode ser feito?
- O Programa das Cidades e Regiões Digitais, financiado por fundos comunitários, tem passado completamente despercebido como rede. Devia-se interligar toda essa informação digital a nível regional, porque seria um meio privilegiado de promoção e valorização da nossa cultura.
Reforma da Administração Pública
Fusão do IPPAR em futuro organismo “é benéfica”
O Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado (PRACE), anunciado no mês passado pelo Governo, indica que o futuro Instituto de Gestão do Património Arquitectónico e Arqueológico vai ficar com a tutela de todo o património classificado. Este instituto integrará as competências do IPPAR, do Instituto Português de Arqueologia (IPA) e de parte da Direcção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais.
O director regional do IPPAR de Castelo Branco diz estar “convencido que a racionalização dos serviços públicos é benéfica e imprescindível para o desenvolvimento nacional”. Tanto que o IPPAR e o IPA “já estiveram reunidos durante cerca de oito anos e nunca houve problemas”, frisa José Afonso.
Segundo este responsável, a fusão de organismos “até pode tornar possível a dotação de mais meios financeiros, sempre necessários”.
José Afonso acredita que a direcção regional não será afectada pela medida, pois “apesar de ser pequena, tem grande capacidade operacional”.
Efeméride comemorada na Guarda
600 crianças aprendem histórias da Sé
Susana Margarido
Foram cerca de 600 as crianças do primeiro ao sexto ano de escolaridade de todas as escolas da zona urbana da Guarda, que ontem tiveram direito a uma visita guiada pela Sé da Guarda, uma das formas encontradas para comemorar o Dia Internacional dos Monumentos e Sítios. À chegada recebiam pinturas faciais e, à saída, depois da lição decorada, balões coloridos.
O início da visita era apadrinhado por uma técnica do IPPAR, Alexandra Ferreira, que guiou os alunos pela longa história do monumento: “Fiz um resumo da história aproximada do que é a Sé, das duas catedrais que existiram antes desta e um pouco da história da Carta de Foral e da Carta da Feira da Guarda”. Os estilos, o tipo de monumento, a divisão do templo por capelas, usadas pela nobreza, suscitaram “reacções muito positivas”.
“Têm estado a adorar, essencialmente sobre a parte dos reis e o tipo de produtos que se vendiam na feira, que durava quinze dias”. Segundo a guia, a avaliar pelo interesse, “os breves ensinamentos e a visita guiada vão incutir o gosto pelo turismo cultural, que já se perdeu na juventude. Penso que isto vai ser uma mais valia para o futuro deles”, frisa.
Da visita, que em média durava meia hora, a apertada escadaria em espiral para os terraços, e os dormitórios, nas torres, suscitaram maior surpresa e interesse, acabando por ser os principais temas desenhados a lápis, no final da visita. Os mais crescidos preferiram as gárgulas em granito, seres imaginários que, no caso da Sé, servem para fazer o escoamento das águas pluviais.
IMPORTÂNCIA DA GUARDA
Depois de Castelo Branco, José Afonso esteve presente na catedral, onde destacou a importância da Guarda. “O distrito, em particular, é riquíssimo em Aldeias Históricas e em património vernáculo (arquitectura popular), mas também património ligada ao cristianismo e judaísmo, além do arqueológico”.
Com um património arquitectónico “riquíssimo” na Beira Interior, o director do IPPAR entende que “é uma região cultural que deve ser agarrada como um todo nos dois distritos”. Porém, acrescenta, “há muito trabalho a fazer mas não se faz mais devido a restrições económicas, por isso, a prioridade são as intervenções em monumentos que ameacem ruir”.
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