Aldeias Históricas
A INAPA publicou em 2004 um excelente trabalho, da autoria de Margarida Magalhães Ramalho e António Homem Cardoso. A capa reproduz uma bela fotografia de Idanha-a-Velha. O texto, referente à história de Idanha-a-Velha, que reproduzo parcialmente, é imensamente rico e cientificamente relevante.
“Idanha-a-Velha é uma terra velha de séculos. Sobre a sua antiguidade já escrevia Al-Razi, um historiador árabe, da primeira metade do século x: «A Egitânia encontra-se a oriente de Coimbra e a ocidente de Córdova. É uma cidade muito antiga, forte e bem dotada, com um território bem provido de cereais, de vinhas, de caça, de peixes e um solo fértil.»
Ao que parece, começou por se chamar Civitas Igaeditanorum e foi fundada no período de Augusto, no último quartel do século i a. C. Por uma inscrição datada de 16 a. C. sabe-se que um cidadão de Emérita Augusta, a actual Mérida, Quintus Iallius, deu de boa vontade um relógio de sol aos Igeditanos. Assim se prova a existência da povoação já nessa altura. m anos mais tarde já era município romano e era citado numa inscrição da magnífica ponte de Alcântara, em Espanha, como tendo sido um dos que tinha contribuído para a sua construção.
Aliás, a antiga Torre dos Templários, muito arruinada, foi levantada e o podium de um templo romano, século 1, dedicado, segundo alguns autores, a Júpiter e, segundo outros, a Vénus. O templo delimitaria um dos
lados do antigo forum. No pico do seu desenvolvimento, Civitas Igaeditanorum deve ter ocupado uma área de vários hectares que se estendia desde o actual limite norte (onde foi localizada uma necrópole romana) até às margens do rio Ponsul onde existiria uma estrutura termal (de que ainda subsistem sas ruínas) que, dada a sua envergadura, deveria sido de carácter público.
Perante o perigo bárbaro dos séculos iii e iv, a cidade recolheu-se atrás de uma forte cintura de muralhas, de que ainda resta um troço importante, sacrificando parte da área construída e reduzindo o perímetro urbano. Como qualquer urbe romana, a antepassada Idanha-a-Velha era abastecida pelas granjas e villas das redondezas, sendo a água proveniente de uma pequena barragem.
Inserida num território fértil e localizada no eixo Guarda/ /Mérida (servindo de ponto de paragem intermédio), a cidade atingiu nos primeiros séculos desta era, uma prosperidade razoável, atestada pelos inúmeros elementos arquitectónicos, capitéis, fustes, bases, colunas, entre outros, aqui encontrados.
Dos séculos de romanização ficaram inúmeros vestígios para além dos já referidos, Dezenas de lápides e inscrições dedicadas a divindades locais e a Juno, Júpiter, Marte, Vénus e Sol e muitas outras de carácter militar e funerário, hoje recolhidas no novíssimo Arquivo de Epígrafes, localizado junto ao Lagar de Varas.
Também nas redondezas se pode ver o que resta da antiga via que se dirigia para Alcântara bem como a ponte de três arcos sobre o rio Ponsul.
No século v, começa um novo período para esta cidade. Ocupada pelos germanos passa a integrar o reino suevo. Pouco se sabe destes tempos. Contudo há factos bem documentados, como é o caso da criação da diocese da Egitânia, em 534 (com sede em Idanha-a-velha) durante o reinado de Teodomiro. Os seus limites correspondiam, mais ou menos, aos do actual Distrito de Castelo Branco. Em 569 esta nova diocese está representada no Concílio de Lugo.
Alguns anos mais tarde, em 585, o reino suevo é integrado no visigótico. Começa então um dos mais prósperos períodos da vida desta cidade, que passa cunhar a sua própria moeda de ouro o Triente. Tudo indica que entre os séculos vi e vii terão sido edificados um baptistério, uma catedral e, eventualmente, um paço episcopal. Se não restam dúvidas de que as ruínas do primeiro são de origem paleocristã, o mesmo não acontece com o edifício da basílica que chegou até aos nossos dias. Os investigadores ainda não chegaram a acordo quanto à sua datação original.
Em 715 todo este território é ocupado pelo Islão. Segundo a historiografia tradicional, a Egitânia teria sido então totalmente destruída e abandonada, só voltando a ser povoada após a Reconquista. Tese que não pode ter qualquer fundamento se atentarmos noutras fontes, de que o testemunho de Al-Razi é apenas um exemplo. Parece evidente que durante os séculos IX e X, a povoação, então denominada Idania, florescia. Basta dizer que durante a ocupação muçulmana o perímetro amuralhado tinha 700 metros, que cercavam uma área de cinco hectares abrigando um milhar de habitantes. Na mesma época, cidades como Alcácer do Sal, Évora ou Silves tinham uma área de sete hectares e uma população da ordem das duas mil almas.
Para alguns historiadores, tanto as muralhas que ainda hoje cercam Idanha como a sua catedral terão sido levantadas neste período. A continuação dos estudos e das escavações arqueológicas poderá, um dia, aclarar este assunto. Mesmo que possa não ter sido criada de raiz mesquita, parece contudo ser consensual a utilização da catedral como templo muçulmano. Aliás, em 1758, referir-se-á nas Memórias Paroquiais (realizadas após o terramoto de 1755 que este «templo foi mesquita de mouros».
Com a Reconquista, Idanha é conquistada por Afonso III de Leão. Integrando o Condado Portucalense, doado a D. Henrique e D. Teresa, torna-se território português desde a primeira hora. Perdida e tomada por diversas vezes, é reconquistada em 1165 por D. Afonso Henriques, que a coloca sob tutela do mestre templário Gualdim Pais.
Contudo, a posse pela Ordem do Templo não é definitiva. Até ao início do século XIII, altura
Em que D. Sancho II lhe concede o seu primeiro foral, em Abril de 1229, Idanha continua a ser disputada por cristãos e muçulmanos. Esta sucessão de «guerras santas» acabará por ditar a sua ruína e o seu total abandono em 1240. Quatro anos depois volta a ser doada aos Templários para ser repovoada, tornando-se então uma comenda da Ordem. É, ao que parece deste período, a construção da torre sobre o antigo templo romano, a qual conserva ainda no tímpano de uma janela, a inscrição do ano de 1245. Durante este período, as muralhas são provavelmente reconstruídas e é refeita e ressacralizada a catedral, sendo o templo dedicado a Santa Maria.”
Na Bibliografia indicada e no referente a Idanha-a-Velha refiro o trabalho de Cláudio Torres, "A Sé Catedral de Idanha", in Arqueologia Medieval, nº1, Mértola, especialmente pela sua especialização na cultura árabe e em particular da influência árabe na península. Como é sabido a influência árabe, durante o período da ocupação da região, corresponde ao período com menos elementos e estudo e relativamente ao qual está praticamente tudo por fazer. Todos os contributos para o seu estudo são releventes.
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