domingo, setembro 07, 2003

Fogo posto
Alexandre O’Neill


I Estou no centro do país, rodeado de incêndios.
Os pinheirais em fogo esbraseiam o ar.
Reguei o telhado e o quintal porque as velhas são muitas.
A vizinha cega, sem qualquer progresso, vai tocando o seu órgão Tornado 4 A irmã apanha velhas, mostra-mas na mão, apagadas ou parecendo ou quase,
e fala do carteiro - motorizada aqui,
saco acolá, sapato mais além -
que, presuntivo pirómano, a si mesmo se teria apagado nas águas do Tejo

II 0 aeroplano da lista vermelha é que semeia o fogo.
Von Richthofen - passe-montanha, óculos "à aviador dentes cerradosé que vem semear o fogo no reino do verde pino.

Abatido em 18, ressurgiu
com o estampido do guarda-chuva que se abre e - pano, arame, madeira - ganha altura para, numa vrille desaparafusada, vir castigar-nos com sua espada de fogo.

Disse Deus: - Ó aviador, vai-me a essa gente remota e avia-lhes uns fogos que se vejam!

Polegar para baixo, Von Richthofen
incendiou milhares de hectares em Portugal. Sua lista vermelha (laranja? Limão?)
é vista com frequência na zona centro do país.

Disse Deus: - Basta. Já sinto calor na cara.

Este, que foi um herói ao serviço do Kaiser
-Cruz da Águia Vermelha
-Cruz da Águia Negra
-Cruz de Ferro-,
descer, quando Deus quer, a incendiário de pinhais?
Credo, custa-me a crê-lo!


Morais e Castro e João Ferreira incluiram este poema no CD-O ritmo da poesia, gostei e fez-me reflectir sobre o último mês de Agosto.

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