domingo, junho 19, 2005

A águia imperial ibérica nidifica de novo em Portugal-Tejo Internacional-Observatório dos Alares

O Público de 19/6/2005 informa que a águia imperial ibérica pode ser vista de novo noscéus da Beira Interior, no Tejo Internacional. Esta águia já não nidificava em Portugal, desde 1978, mas em 2003 foi confirmada a sua nidificação de novo em Portugal e na Beira Interior. A protecção ecológica e a criação da Reserva do Tejo Internacional permitiu que essa águia, já considerada como extinta em Portugal, encontrasse, novamente, condições para aqui nidificar. O seu alimento de eleição, o coelho, com a criação da reserva, passou a ser abundante, criando condições para a sua nidificação. Mais um motivo, para além de muitos outros, para os amantes da Natureza visitarem a região e ter o prazer de observar o voo, no alto dos céus, da águia imperial ibérica

In: Público (versão em html para assinantes, 19/6/2005)
Director: José Manuel Fernandes
Directores-adjuntos: Nuno Pacheco e Manuel Carvalho

POL nº 5564 | Domingo, 19 de Junho de 2005

O regresso da águia-imperial
Por António Granado (textos) e Pedro Cunha (fotos)


Já não nidificava em Portugal desde 1978,
mas agora está de volta ao território nacional. Chama-se águia-imperial e é uma das espécies
de aves de rapina mais ameaçadas do mundo


Quando em 2002 viu por várias vezes águias-imperiais em território nacional, o biólogo Carlos Pacheco percebeu que não podia ser um acaso. A espécie não nidificava em Portugal desde 1978 e as observações de indivíduos errantes eram muito escassas. "Vi logo que não podiam ser indivíduos dispersos, tanto mais que as observações foram feitas em Março e Abril", ou seja, em pleno período de nidificação.
No ano seguinte, mais precisamente a 10 de Junho, Carlos Pacheco veio a confirmar as suas suspeitas e a inscrever o seu nome numa página feliz da conservação da natureza em Portugal: num pinheiro-bravo, a escassos quilómetros da fronteira com Espanha, na área do Parque Natural do Tejo Internacional, um casal de águias-imperiais tomava conta de uma cria, a primeira detectada em território nacional nos últimos 25 anos.

Um novo casal detectado em 2004
Ameaçada quase até à extinção, a águia-imperial (Aquila adalberti) é uma espécie autóctone da Península Ibérica, conhecendo-se actualmente 198 casais nidificantes, dos quais apenas dois em Portugal. Segundo a Estratégia para a Conservação da Águia-Imperial Ibérica, da autoria do Ministério do Ambiente espanhol, a espécie atingiu os seus números mais baixos nos anos anteriores a 1983, altura em que foram proibidos os iscos envenenados.
Agora, no mesmo local onde fez as observações de 2002, uma pequena elevação sobre o principal território de caça deste casal, Carlos Pacheco insiste em procurar as aves no céu, ou por cima das azinheiras que, aqui e ali, povoam um campo aberto, coberto de rosmaninho, giestas e esteva em flor. Roxo, amarelo e branco a salpicar um chão verde onde se alimentam os coelhos, o alimento preferido destas grandes aves de rapina. "Tenho-as visto aqui muitas vezes a caçar", explica Carlos Pacheco, enquanto perscruta o horizonte com um telescópio bastante potente. "Temos de ter paciência e esperar um bocado."
No ano passado, Carlos Pacheco acrescentou mais um casal detectado à população de águias-imperiais na parte portuguesa do Tejo Internacional, apesar de se ter chegado a temer o pior: "Detectámos um novo casal, mas a fêmea foi provavelmente abatida já na época de nidificação", diz Carlos Pacheco. "Passados apenas alguns dias, entrou uma fêmea imatura no casal, que se recompôs e acabou por dar três crias." Do casal de 2003 resultou mais uma cria, o que eleva para quatro as águias-imperiais conhecidas nascidas em Portugal durante o ano passado.
No céu, as águias-imperiais continuam sem aparecer. Desde que aqui estamos, só um casal de águias-calçadas faz questão de voar baixinho e, bem no alto, um grifo deslizou em direcção a Espanha. Na estrada de alcatrão que acompanha o território de caça ainda não passou um único carro, sinal de que estamos mesmo numa zona inóspita. Resta-nos esperar, enquanto uma brisa suave nos traz de todos os lados um chilrear constante de inúmeros pássaros.

Dois pontos negros
lá no alto
As águias-imperiais não são aves de rapina fáceis de observar. Voam normalmente bem alto e daí observam todo o território de caça à espera de um coelho mais distraído ou doente. Ameaçadas quase até à extinção - a espécie está classificada no nível máximo de alerta no "Livro Vermelho dos Vertebrados de Espanha" -, as águias-imperiais começaram a sua lenta recuperação quando foram protegidos os seus territórios de dispersão, como explica Carlos Pacheco.
Depois de saírem do ninho, os juvenis vão para zonas sem adultos "com comida e sossego", onde passam dois a três anos - a estas zonas chamam os biólogos "zonas de dispersão". Só depois deste período de segregação dos adultos os juvenis voltam às suas zonas originais para arranjar companheiro ou companheira e aí procriar.
Durante anos era difícil recrutar novos membros do casal quando um deles era abatido a tiro ou envenenado. Com a protecção destas zonas de dispersão, tudo se tornou mais fácil: agora, cada vez que um casal se desfaz em plena época de nidificação, é mais fácil a reconstrução. Como aconteceu, no ano passado, ao segundo casal português.
As águias-imperiais finalmente aparecem. São dois pontos negros lá muito, muito alto, contra as nuvens cor de chumbo. Asas semi-fechadas, passam de um lado para o outro do território de caça mesmo à nossa frente observando o que se vai passando cá em baixo. Quando se voltam é possível ver (com telescópio) a mancha branca que lhes cobre os ombros. São águias-imperiais, sem qualquer dúvida, tanto mais que a fêmea é agora atacada por uma águia-calçada que não gostou de a ver no seu território.
Do binóculo para o telescópio, do telescópio para o binóculo, Carlos Pacheco vai explicando os hábitos destas imponentes rapinas que, no entanto, nunca baixam o suficiente para deixarem de ser apenas pontos a olho nu. Os coelhos é que não querem entrar na história e, tal como apareceram, as águias-imperiais desaparecem agora cada vez mais alto, provavelmente a caminho do seu pinheiro-bravo preferido.



PÚBLICO - EDIÇÃO IMPRESSA - SOCIEDADE

Director: José Manuel Fernandes
Directores-adjuntos: Nuno Pacheco e Manuel Carvalho

POL nº 5564 | Domingo, 19 de Junho de 2005

Prato preferido: coelho

A águia-imperial alimenta-se principalmente de coelhos, que caça em zonas semi-abertas de montado. Na zona do Tejo Internacional, os coutos de caça têm sido uma grande ajuda para a sobrevivência desta espécie ameaçada: para terem coelhos nas suas propriedades, os donos dos coutos criam zonas a que chamam marouços, amontoados de lenha e pedras no meio do montado aberto que servem de abrigo a estes animais. Quando os marouços estão suficientemente distantes é possível que famílias de uma e de outra zonas se encontrem e possam procriar, evitando assim a perigosa consanguinidade. A abertura de pontos de água para os coelhos é também importante para a sua sobrevivência. Com presas em abundância, a águia-imperial pode assim alimentar facilmente as suas crias, que, se não forem perturbadas, chegarão à idade de voar e de poderem dispersar-se.



PÚBLICO - EDIÇÃO IMPRESSA - SOCIEDADE

Director: José Manuel Fernandes
Directores-adjuntos: Nuno Pacheco e Manuel Carvalho

POL nº 5564 | Domingo, 19 de Junho de 2005

Um em cada quatro chega à idade adulta

A raridade da águia-imperial não se deve apenas ao facto de os seus habitats estarem ameaçados ou ao número relativamente baixo de crias que nascem todos os anos. A mortalidade nesta espécie também é bastante elevada, como provam os estudos que desde há anos se vêm realizando em Espanha para acompanhar a evolução da população de águia-imperial. Um programa de marcação de vários exemplares com emissores-rádio, realizado entre 1996 e 1998, chegou à conclusão que apenas um quarto das aves chega à idade reprodutora. Segundo o relatório do Grupo de Trabalho da Águia-Imperial, a funcionar em Espanha, entre 1999 e 2003 foram encontrados 24 exemplares electrocutados, quase cinco por ano. No mesmo período, 11 águias-imperiais foram encontradas envenenadas, quatro mortas em armadilhas e cinco abatidas a tiro.

Sem comentários: