sexta-feira, janeiro 14, 2005

in: Centro do Fundão

Asphodelus Bento Rainhae protegida por plano de gestão a partir do final do mês

2005-01-13
Fonte: Diário XXI
O Plano de Gestão da Serra da Gardunha, elaborado no âmbito do programa Rede Natura 2000, privilegia a preservação da Asphodelus bento-rainhae, uma planta rara que apenas existe na encosta da Serra atravessada pelo concelho do Fundão. Esta semana, a Águas do Zêzere e Côa transferiu cerca de 150 exemplares da planta, descobertos num local destinado a obras, para um local onde serão preservados.

Entra em funcionamento, no final de Janeiro, o plano de gestão da Serra da Gardunha, elaborado no âmbito do programa Rede Natura 2000. A garantia foi dada por João Pedro Silva, biólogo do Instituto de Conservação da Natureza (ICN), durante a translocação de mais de 150 exemplares da planta Asphodelus bento-rainhae, espécie endémica da Serra da Gardunha, realizada na tarde de terça-feira. As plantas foram retiradas do local, nos limites da freguesia de Aldeia de Joanes, onde vai ser construído um reservatório de água para abastecer o concelho do Fundão - obra da responsabilidade da empresa Águas do Zêzere e Côa (AZC).

A empresa optou pela transferência da planta para um local cedido pela Junta de Freguesia.

Uma das medidas do plano de gestão a implementar, segundo o biólogo, prende-se com a protecção do habitat daquela espécie da Gardunha. “As medidas de gestão poderão ajudar a conciliar diferentes interesses, por forma a que a natureza não saia prejudicada”, explica o especialista. Trata-se de mais uma medida que surge no seguimento de outras para proteger a Asphodelus bento-rainhae. Recorde-se que em Setembro último, o Conselho de Ministros aprovou uma resolução que alarga os limites do Sítio Protegido da Serra da Gardunha (Rede Natura 2000), para acautelar a preservação da espécie.

Já antes, a preservação da espécie endémica tinha servido de base ao Projecto Life, levado a cabo pela Associação de Defesa e Desenvolvimento da Gardunha (ADESGAR) entre 1998 e 2003. Aquela instituição procedeu à compra de terrenos onde a planta cresce e é alvo da gestão adequada e promoveu acções de sensibilização da populações com vista à subsistência da Asphodelus bento-rainhae.


Gardunha acolhe entre 10 a 15 mil exemplares da Asphodelus bento-rainhae

Vivem na encosta, do Souto da Casa ao Alcaide

A Asphodelus bento-rainhae é uma planta da família das liliáceas, endémica da vertente Norte da Serra da Gardunha. A planta vive nos castinçais e carvalhais bem conservados, numa faixa compreendida entre os 490 e 850 metros de altitude, desde o Souto da Casa até ao Alcaide, freguesias fundanenses. Frequentemente, surge também nos taludes dos cerejais onde não foi feita a aplicação de herbicidas, ou nas orlas dos caminhos.

A planta pertence ao género Asphodelus da qual existem em Portugal sete espécies descritas e que se distribuem de Norte a Sul do país. Na Serra da Gardunha existem três espécies de Asphodelus, também conhecidas por abrotéas, todas muito similares. Somente se distingue a Asphodelus bento-rainhae através de algumas características particulares, tais com as cápsulas e os tubérculos. Com esta planta coexiste o Asphodelus macrocarpus que se distingue através de cápsulas maiores e globosas, e de tubérculos apendiculados e fusiformes.

A planta não tem qualquer aplicação económica, no entanto, segundo alguns testemunhos populares, o suco do tubérculo é utilizado em certas infecções de pele (eczemas). As folhas previamente cozidas dos Asphodelus macrocarpus, serotinus e bento-rainhae eram utilizadas como complemento na alimentação dos suínos.

Estima-se que na encosta da Gardunha existam entre 10 a 15 mil exemplares da Asphodelus Bento Rainhae. No entanto, João Pedro Silva, biólogo do Instituto de Conservação da Natureza (ICN), garante que “a preservação não está garantida a longo prazo, Por isso está prevista a sua protecção local”.


Bento Rainha era companheiro de descoberta do botânico

Pinto da Silva encontra planta em 1956

A espécie foi pela primeira vez descrita em 1956 pelo botânico Pinto da Silva, que lhe deu o nome do seu amigo e companheiro de descoberta, Bento Victória Rainha. Quando Bento Rainha faleceu, segundo o testemunho deixado por Pinto da Silva, ainda conservava no seu jardim, em Sintra, um exemplar de Asphodelus bento-rainhae que ambos tinham descoberto na Serra da Gardunha.


Autarquia fundanense realça importância da sensibilização

Henrique Dias, vereador com o pelouro do Ambiente na autarquia fundanense, também acompanhou anteontem o processo de translocação dos vários exemplares da Asphodelus bento-rainhae. O responsável explica a importância da planta e salienta a necessidade de sensibilização dos particulares para a preservação da espécie endémica da Serra da Gardunha. “É necessário que a par das entidades públicas, os particulares também procedam à desmatação e limpeza, com a consciência de que é preciso preservar esta espécie”.

Segundo Henrique Dias, a ADESGAR “fará, muito em breve, algum trabalho de dinamização das escolas e do público em geral”. “Também em relação aos agricultores e produtores de cereja, foi feito um grande trabalho de sensibilização. Hoje, nos terrenos da grande maioria dos produtores há grandes plantações de cereja com as quais a planta convive.

De alguma maneira a sensibilização foi feita e foi importante”, conclui o responsável pelo ambiente na autarquia fundanense.

Sem comentários: